20110831

Márgara like Margareth? Yes, but without eth: Márgara.

Sim, é tudo novo.
Sim, é tudo estranho e divertido.
Cada minutinho que passa (e eles custam a passar), gosto mais desse sotaque, dessa gente que não me entende, dessas construções medievais, vitorianas e ao mesmo tempo modernas e cheia de vida.
Estou fascinada por este amor deles pela história, pela honra e pelas lutas que deram (ou não) certo.
Adoro essa cerveja a granel, essa comida gordurosa, este transito ao contrário. Óbvio que pareço uma criança atravessando a rua, sem saber de onde os carros vêm, para onde eles vão. E o que isso importa? Sou criança em tantos momentos mesmo!
E então, cá estou eu em um balcãozinho no canto de um pub The TolBooth Bar) que existe desde 1906, cuja dona é filha da filha do filho do dono (ou alguma raiz direta parecida com essa), feito todo em madeira de mogno marrom escuro. Quando eu digo todo, é todo mesmo: bancos, banquetas, mesas, mesinhas, parede, portas, separador de mesas, balcão, paredes, prateleiras e adornos detalhados e entalhados. Ah as prateleiras! Cheias de garrafas de destilados naquelas coisinhas que as mantém de cabeça pra baixo pra servir doses sem desperdício nenhum. Os destilados são além de uísques, há também vodka, conhaque e uísque nacional.
Estou aqui, tentando ler o jornal, tomando uma Tennent’s Special pale ale, que me parece uma boa pedida, pois ainda são 19h30 e está claro lá fora. John McIntyre, o cantor preferido daqui do pub,  começa a cantar, tocando guitarra e acompanhado de um teclado eletrônico. SIM! Bateria eletrônica TUM DUM TSSS existe aqui também. A diferença é que o cara toca roquenrol clássico, pop e hip hop, há velhos com cabeças brancas desdentados pelo balcão principal e meninas de mini saia rebolando até a metade do caminho do chão. Creio que iriam até o chão se soubessem ou se o horário permitisse.
Um dos tios (com todos os dentes, viu?) veio falar  comigo e perguntar se eu estava escrevendo uma novela, um poema ou uma carta de amor (obrigada, eu entendi o contexto inteirinho da frase). Contei que não era daqui e, depois de trocarmos umas frases, ele me beijou 3 vezes alegando nunca ter beijado uma mulher brasileira. Porra, Michel! Arruma outra desculpa!
Minha avó acabou de entrar no pub. Ela é exatamente igualzinha à minha mãe mas mais velha, com mais cabelos brancos e mais magra (incrivelmente mais tudo isso!). A diferença entre elas é que minha avó acabou de pedir uma cerveja, foi até o John pedir uma música e usa uns tênis Nike daora!
Michel está dançando com a menina mais bonita do bar, a que veio com a de mini saia bege (BEGE?!? Nem em calcinha se usa isso, querida! Imagina na saia! Sorte tua que tens pernocas bonitas)  e que destoam - juntas -  do restante da galera. A menina que dança com o Michel é realmente linda, usa um saião vermelho e uma regata azul. Sempre haverá um GRENAL* onde quer que eu esteja!
VÓ, SAI DA PISTA! Deixa o Michel beber sua cerveja!
Isso tudo parece uma grande festa de família, mas não é. É só um pub irlandês em plena Escócia! 
E vou dizer, depois de ter visto um grupo de górdénhas ensaiando streetdance ao som de Rihana remix dentro de uma igreja sem bancos nem padres e que tinha um pub no subsolo, eu não duvido de mais nada nessa cidade.
Ok, ok, ok e ok de novo. Minha avó acabou de tirar a menina do saião vermelho pra dançar e está rebolando até o chão**. Melhor ir pra casa. Estou há menos de 48h aqui. Preciso deixar essa cara de surpresa pra outros momentos também.
Acabei de tomar uma decisão muito séria: vou parar de comer pra viver em lugares como este. Não é possível ter uma menina que poderia passar por puta em POA com um tio engravatado de cabelo branco e brinco de ouro com um cara mais bebum que toda minha família com um casal que parece ter saído da calçada da fama com um tio que poderia estar ali na João Telles guardando carro com um chapista da Lancheria com minha vó com.. com.. com.. comigo!
Hotel Califórnia, não, John. Lembro minha infância e penso que estou em casa.
Jaque veio falar comigo. Sim, eu sou uma estranha no ninho deles. É um bar de gente que vai todo dia no mesmo bar. É um bar que todos se conhecem, sabem o que os outros fazem e são amigos, parentes ou os dois ao mesmo tempo.
É por isso que minha vó conhece a guria da saia vermelha que conhece o Michel que conhece a de mini saia que conhece o sobrinho da Jaque que conhece o tio bebum que fala russo que conhece o gerente que conhece todo mundo que conhece minha vó*** que não me conhece.
Jo ( lê-se Djo, não posso esquecer), o gerente da casa, veio falar comigo, se apresentar, ver se estava tudo bem e se eu não preferia trocar de cerveja. Dát õn és bétar e me deu uma pilsen. Sim, mesmo sendo pilsen, era muito melhor, obrigada, Jo. 
Thanks, J&J, for every second that I had fun.

Eu sou a menina solitária estranha e desconhecida que usa polainas e all star no canto do balcão do canto que não conhece ninguém. 
Eu sou a estranha menina solitária e desconhecida que brilha os olhinhos por qualquer bobagem que passa desapercebida pela maioria.
Eu sou a solitária estranha menina que continua se apaixonando a cada minuto por cada fração de vida.

E agora, 20h20, fecho com duas conclusões:
1. Eu realmente sou uma das atrações da festa do pub e
2. Nunca fiz amigos correndo no parque, malhando na academia ou comprando lençóis.

Acho que me perdi.
E acabei de me achar.

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Escrito num caderno, repassado pro blog, sem cortes, sem alterações, pra ser o primeiro de muitos retratos das pequenas aventuras da menina flor colorada em um vasto mundo escoces.
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*  Tá, a blusa é lilás e a saia é goiaba, uma combinação muito linda, mas pode me deixar com meu bairrismo?
** Ok, o chão dela é bem acima do meu e do teu, eu sei, mas pra alguém de 249 anos de idade, qualquer mexidinha de joelho é uma rebolada até o chão,  né?
*** Minha avó é daorinha mesmo, hein, véi!